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FILOSOFIA

A Filosofia nasce na Grécia, em Mileto , cidade Jónica da Ásia Menor, hoje Turquia. A sua emergência resulta do facto dos primeiros pensadores sentirem necessidade de compreender e explicar a natureza (Physis) de modo racional.

FILOSOFIA

A Filosofia nasce na Grécia, em Mileto , cidade Jónica da Ásia Menor, hoje Turquia. A sua emergência resulta do facto dos primeiros pensadores sentirem necessidade de compreender e explicar a natureza (Physis) de modo racional.
30.04.13

Um enorme buraco chamado swap


António A. B. Pinela

Mais um enorme buraco. O poder financeiro e a incompetência agridem, sem descanso, o Estado Português, lesam os portugueses, sempre em favor dos mesmos – os ricos, os especuladores – aqueles que se sentam à mesa do Orçamento do Estado.

As notícias que vêm a público são de arrepiar o cabelo. Dizem aquelas, que pululam pelos meios de comunicação tradicional e pela Net, que algumas empresas públicas (mais de uma dezena) pagaram ou estão a pagar juros superiores a 20 %, por dinheiro pedido a algumas instituições bancárias.

Serão às centenas os contratos especulativos celebrados pelas empreses públicas, no decurso dos últimos dez anos. Ao que se diz, as importâncias contratadas constituiriam autênticos taleigos azulados, cujo conteúdo seria empregue para despesas,  provavelmente, jamais esclarecidas.

As notícias relatam que o enorme buraco já alcançou cerca de três mil milhões de euros que, aliado ao enorme buraco do Banco Português de Negócios (BPN), faz perceber por que razão o país está no estado em que está – a pedir esmola.

Por que chegaram as taxas de juro a este patamar? Porque tais produtos financeiros terão ficado protegidos pela variação da taxa de juro (swap). O Negócio sob esta imagem terá sido feito apenas com bancos estrangeiros (americanos, alemão, inglês e espanhol), comenta-se. Este negócio está a ajudar a causar graves danos ao Estado.

Segundo a informação disponível, na perspectiva das empresas, esta contratação seria uma medida que protegeria as mesmas contra a subida dos juros, mas, diferentemente do que pressagiaram, revelou-se um autêntico sorvedouro do dinheiro público, em favor dos especuladores financeiros. O que representa, para o povo português este negócio ruinoso? Mais austeridade, mais miséria, logo, mais pobreza.

A TROIKA quer que o governo de Passos Coelho/Vítor Gaspar corte mais de 4000 milhões de euros nas Funções Sociais do Estado. O enorme prejuízo, ora descoberto já aponta para valores na ordem de 3000 milhões de euros, o que equivale a 75 % daquela verba ‘swap’. Se adicionarmos o outro buraco já referenciado, o BPN, que já consumiu mais de 5000 milhões de euros ao erário público, ou seja 125 % relativamente à verba que a Troika quer cortar aos portugueses, damo-nos conta de 8000 milhões de euros gastos sem qualquer proveito para os portugueses. Percebe-se, assim, muito bem, que o corte que o governo quer aplicar é desnecessário. Com efeito, ainda sobram 4000 milhões como saldo positivo, que dá e sobra para o governo pagar o que tem extraído aos trabalhadores e aos reformados. Logo, toda esta crise que se tem aplicado a Portugal é um embuste. O dinheiro tem que estar em algum lado. O governo deve procurá-lo.

Pergunta-se, ainda: qual a razão porque os cortes atingem sempre os mais fracos, com a perda de emprego, de subsídios no desemprego, de férias ou de Natal ou na doença, cortes nos salários e nas pensões dos reformados; aumento de impostos? Quem cometeu aqueles erros foram os trabalhadores por conta de outrem, os reformados, os pobres? Ou foram os bem instalados na vida à custa dos anteriormente indicados? Porque não pagam eles os já descobertos 8000 milhões desaparecidos? Onde está a moralidade dos cortes?

Quem gere os negócios dos bancos que vão à falência, ou das empresas públicas que têm resultados negativos, todos os anos? Não são os gestores altamente competentes, pelo menos aos olhos de quem os nomeia e a seus próprios olhos, e que ganham fortunas mensais, se comparadas com o comum dos trabalhadores? Sendo assim, que moral têm os governantes para nos exigirem sacrifícios da dimensão daqueles com que estamos a ser alvejados?

Só estes dois buracos financeiros (banco e algumas empresas públicas) mostram bem como são geridos os dinheiros públicos. 8000 milhões para onde foram? É obra. Seria necessário e saudável para credibilizar política, que todos os sectores do Estado fossem sujeitos a uma profunda investigação.

Para que não sejam sempre os pobres e a classe média (que já não existe, desde Passos/Gaspar) a pagar a factura, todos os Ministérios, e o que deles depende, deveriam passar por uma profunda auditoria – de fio a pavio. Depois de uma acção assim levada a cabo, e chamados a prestar contas os protagonistas responsáveis, creio que os portugueses voltariam a acreditar nos políticos. (Abril de 2013).

António Pinela, Reflexões.

17.04.13

Liberdade implica responsabilidade


António A. B. Pinela

A vida humana (não a vida biológica) é vida construída, que se faz todos os dias. É uma tarefa. A vida animal tem todos os mecanismos de regulação – o sistema de instintos. Os instintos no homem são muito limitados. Em compensação, o homem tem a faculdade da imaginação, o poder mental de descobrir horizontes, a capacidade de projectar o seu percurso, de se projectar, como diria Sartre. É este pormenor que permite distinguir o que o homem é e quem é. Este simples enunciado faz a diferença.

O que o homem é procede de seus pais, avós, antepassados e dos elementos que integram o cosmos (oxigénio, hidrogénio, carbono…). Quem é o homem procede da educação, formação, cultura, hábitos, usos e costumes em que cresceu e se desenvolveu. Ora, desprovido de um sistema de instintos que regule a sua praxis, o homem decide, em cada momento da sua vida de acção, o que fazer. Com efeito, tem que optar entre múltiplas possibilidades que se lhe apresentam. A opção é um acto livre.

Se, como dizia Karl Jaspers, «o homem é um ser a caminho», é naturalmente um ser livre, como dizia Jean-Paul Sartre. Portanto, se o homem é um ser naturalmente livre, poderá renunciar à sua liberdade? Obviamente, que não.

Vejamos: se me predisponho a aceitar ou a fazer o que determinada pessoa, ou grupo, me impõe, não estarei a hipotecar a minha liberdade? É evidente que não, uma vez que decido tal predisposição. É um acto inquestionável da minha liberdade de que não posso renunciar. A liberdade é irrenunciável.

Parece confuso? Não é. Esclareça-se: em tese, digamos que há vários patamares de liberdade. Três exemplos: a) Se a vida profissional de um homem depende de outro homem, a liberdade daquele está limitada aos humores deste. Mas ele pode dizer não a todo o momento e, quando o faz, pratica um acto de liberdade, mas isso pode custar-lhe o emprego. b) O homem pode não ter recursos para a sua subsistência e isso pode fazer com que abdique de parte da sua liberdade, colocando-se à disposição de terceiros. Mas pode dizer não, nem que isso agrave mais a sua situação. c) Pode viver numa situação política que não lhe permita a liberdade de decisão, de expressão, de movimentos. Mas pode dizer não, sofrendo as consequências de tal decisão.

Nos casos indicados, como exemplos, o homem é sempre livre. A todo o momento, ele pode renunciar ao conforto de um bom emprego, pode não aceitar as migalhas oferecidas, pode estar consciente da sua atitude, mesmo que os grilhões do ditador lhe limitem os passos. Portanto, mesmo que, em casos limite, isso lhe custe a própria vida, o homem pode sempre exercer a sua liberdade. Uma coisa é ter liberdade de acção e de movimentos, outra é ser livre. Ao assim pensar estou a exercer uma atitude de liberdade, porque a liberdade é uma atitude, um acto de consciência.

Posso, num certo momento, estar privado da minha liberdade de movimentos, mas tal não significa que eu não seja um homem livre. Estar condenado, calado, ignorar ou não responder não significa estar prisioneiro, concordar ou desconhecer, mas apenas mostra a força bruta que pretende limitar a minha liberdade. Quem me condena, limita a minha acção ou me humilha pode ser menos livre do que eu. Eu posso estar preso numa cadeia e, consciente dos meus actos, sentir-me mais livre que o Juiz que me condenou. Homem livre não é, por certo, aquele que, em determinado momento, detém o poder e que, pela força e autoritarismo, oprime e limita os movimentos, as decisões, o livre arbítrio do outro; homem livre não é aquele que, sob a capa do poder e do saber, de modo ignorante e autoritário, pretende subjugar o outro, limitando-o na sua acção, humilhando-o perante os outros, como ocorre frequentes vezes.

Façam os ditadores o que fizerem, nunca conseguirão apoderar-se do OUTRO, isso é impossível. A liberdade é constitutiva do ser humano, o que faz com que o homem seja um ser responsável. Porque sou livre, sou responsável. A liberdade é um postulado da responsabilidade. Porquanto, ao saber-se responsável, o homem sente que está sujeito ao cumprimento de deveres. Para assumir os deveres inerentes à sua condição e à sua prática, o homem só pode ser livre. Se não fosse livre, como se responsabilizaria pelos seus actos? Do que está dito conclui-se que liberdade e responsabilidade caminham a par, são absolutamente inseparáveis.

Mas ao longo da história, a liberdade tem conhecido muitos adversários. São aqueles que têm temor da liberdade, tanto da sua como da dos outros. Aquele que oprime, mais tarde ou mais cedo, acaba por ser oprimido e alienar a sua própria liberdade. A História está cheia de exemplos. Cada homem só é livre e responsável se o outro também o for, na mesma medida. E a medida é coisa óptima, disse Cleobulo.

António Pinela, Reflexões.

15.04.13

O regresso ao existencialismo


António A. B. Pinela

Como outras correntes da Filosofia, o existencialismo marca o seu tempo. Compreende-se que o século vinte tenha produzido esta forma de pensamento. Pensamento traduzido numa filosofia que melhor responde ao tempo vivido, a partir da Primeira Grande Guerra Mundial. Começa, neste período a estar em causa a preservação da existência humana, como se verificou com a Segunda Guerra Mundial, e outras ocorrências ulteriores, outras Guerras. Desta forma, o existencialismo não é uma filosofia que, prioritariamente, se contraponha a quaisquer outras correntes de pensamento, mas sim uma forma de dar resposta àqueles para quem a vida humana mais não é do que um simples instrumento, que pode ser útil em determinado momento mas que, depois, se ostraciza ou destrói, quando deixa de ter utilidade; para quem, o cidadão, que perde esta qualidade, às mãos de déspotas ou de personalidades toscas, não passa de simples número estatístico.

É tal a força deste novo modo de pensar (o existencialismo) que influenciará todas as formas de expressão do pensamento, no decurso do século XX. Nenhuma manifestação humanista ficou incólume: da filosofia à literatura, do ensaio ao teatro, do cinema à telenovela. Em sentido positivo, o existencialismo passa a ser uma filosofia em moda, da qual é impossível estar ausente.

Dadas as circunstâncias em que emerge, o existencialismo é uma corrente de pensamento muito diferente das correntes racionalistas que a antecederam, com relevância para o cartesianismo. Como diriam os seus cultores, é uma filosofia que se preocupa, não com as formas abstractas de pensamento, não com os encadeamentos lógicos, não com os sistemas em que é preciso enquadrar o ser humano, mas sim com o homem concreto, o homem em situação, o homem que vive, que ama e sofre. E, nesta medida, é uma filosofia que recusa a redução do homem ao plano conceptual das «lógicas» que imperavam (e que voltam a imperar, em força, neste tempo que vivemos. Veja-se o que se passa com a organização da Europa, onde reinam as tecnocracias, e os homens sem rosto, eufemísticamente ditos: os mercados).

Uma vez que, o que caracteriza o homem, no seu pensamento emergente, não é a objectividade (estatística), mas sim a sua subjectividade, e sendo esta o ponto de partida do ser consciente, é a partir desta consciência que o homem pode alcançar a objectividade, e não o contrário. É com o meu pensamento que inicio o meu percurso consciente, e não inserto em espartilhos saídos de estereótipos por outros elaborados e impostos, que consideram como bons para os outros, não para si.

Partindo do primado da pessoa humana, afirmar-se-á que o existencialismo não é uma filosofia que se compare aos sistemas tradicionais, que procuram formas de unificação do pensamento, em torno de ideias chave, com vista a um todo organizado e constituído em sistema. Ao invés, o existencialismo preocupa-se e ocupa-se com a vida concreta do homem, com o mistério da vida, com o que se passa consigo no dia-a-dia. Isto é, os problemas que a vida traz, os fracassos e as vitórias, a angústia e o desespero, o absurdo da vida e da morte e, também, a esperança. Simplesmente, é uma reflexão cujo fundamento autêntico e essencial é a vida concreta. É, por isso, uma filosofia do homem concreto.

Este tempo que vivemos, hoje, leva-me a revisitar esta corrente de pensamento, que continua a fazer sentido no século XXI. As Guerras que teimam em não parar; as agressões contínuas, de toda a ordem, à pessoa humana; a insegurança em todas as suas dimensões; os falsos democratas que por aí pululam, arrogando-se perigosamente da luz que ilumina as trevas; a moda das não ideologias, que nos deixa desarmados, porque ficamos sem saber quem é quem, ou das ideologias cegas neo-liberais, onde não é difícil encontrar protagonistas, que estão determinados a aplicar os seus ideais, como já se constata, assim que a oportunidade surja.

É para contrariar esta situação que penso que se justifica o regresso ao existencialismo, ou, dito de outra forma,  à reflexão continuada sobre os valores que defendem a pessoa concreta. Sem deixar de agir, é necessário pensar. Pensar o Homem concreto. Tarefa de que os filósofos e outros pensadores não se podem alhear, sob pena de não cumprirem o seu papel em prol de uma sociedade justa.

António Pinela, Reflexões.

14.04.13

O Sentido da Educação Filosófica


António A. B. Pinela

A propósito, deste dia de reflexão (01.10.17), dia de eleições autárquicas, se tiver paciência, leia este texto para descontrair.

Falaram-me há dias do sentido.

Que é para ti o sentido?

Que sentido?

O sentido que faz sentido!

Referes-te ao sentido da vida e das suas contradições?

Sim.

Achas que tem sentido?

Creio que falas do sentido de viver, de ter, de ser e de aprender…

Sobretudo de aprender e de Ser.

Naturalmente que aprender e Ser faz sentido!

Mas diz-me, existe diferenças entre aprender e ser?

Ou seja, para aprender é necessário Ser, achas que isto tem sentido?

Tem sentido aprender?

Com certeza!

Se não aprendemos, como sabemos!

Mas sabemos alguma coisa?

Que cepticismo esse, homem!

Porque aprendemos, sabemos.

Quer dizer, porque sabemos, aprendemos,

O que me parece que faz sentido...

De que coisas aprendemos o sentido?

Aprendemos o sentido da Geografia e da Economia,

Do Português, do Inglês, do Latim, do Grego e do Francês.

Da Gramática, da Linguística e da Matemática.

Da Biologia, da Física, da Mecanotecnia e da Sociologia.

Da Agricultura e da Filosofia.

Que mais temos que aprender?

Outros saberes que nos indiquem o lugar do nosso Ser!

Sabes, por acaso, onde vivo?

Eis o meu endereço:

O meu nome é António        

Resido numa Rua de uma Cidade,

Lisboa é a Capital,

Portugal é o meu País,

A Europa é o Continente,

Terra, o Planeta,

Um dos nove (?) do Sistema Solar,

Do qual disto cerca de 150 milhões de quilómetros.

O Sol, o Sistema a que pertenço,

Dizem os Sábios, que é a estrela que se encontra mais perto de mim.

Por seu turno, o Sistema Solar está inserido numa Galáxia que contém aproximadamente 100 milhões de estrelas, cujo centro é constituído pela Via Láctea.

Podem, ainda, endereçar-me a vossa correspondência para este sítio,

Que é uma Nebulosa, ou faixa esbranquiçada,

Que se vê, no Céu, em Noites claras e é devida a uma multidão de estrelas.

A centenas de milhões de anos-luz existem outros sistemas, separados do nosso pelo Vazio,

Que se distribuem no Espaço infinito, como pequenas ilhas num Oceano Imenso…

Mas se não me encontrarem em nenhum destes lugares,

Há outras possibilidades, há sempre mais uma possibilidade:

Enviem o vosso correio para o Infinito,

Que Aristóteles sustentava a impossibilidade de se conhecer,

Mas que Demócrito dizia que era o Espaço Vazio.

Já que vos dei o meu endereço,

Espero por notícias vossas!

Agora já sabem onde estou.

Mas sabeis quem sou?

Sófocles afirma que

            “Nada é mais maravilhoso do que o homem”.

            Eu sou um homem.

Nietzsche defendia que o homem é

            “O animal que não se define nunca”.

            Fico confuso!

Karl Jaspers, usando de bom senso, defende que o

            “Homem é, em princípio, mais do que pode saber de si”.

            O que me conforta.

António Gedeão diz de nós

            “Inútil definir este animal aflito.

            Nem palavras,

            Nem cinzéis

            Nem acordes

            Nem pincéis

            São gargantas deste grito.

            Universo em expansão.

            Pincelada de Zarcão

            Desde mais infinito a menos infinito.”

Já sabemos também quem sou.

Mas não fica por aqui a minha curiosidade,

Que é fonte de saber: Lembras-te?

Falámos de algumas disciplinas

Que não me disseram de onde venho,

Que caminhos serão os meus, és capaz de me indicar?

E sem te querer aborrecer, usando o teu saber,

Diz-me para onde vou?

Que projecto é o meu Destino?

E se não sou atrevido,

Faz-me mais um favor,

De tudo isto explica-me o Sentido!

No entanto, se te sentes embaraçado, podemos interdisciplinar,

Façamos todos uma reflexão sobre a nossa situação,

Implementemos uma dialéctica para encontrar a síntese que nos indique o Caminho, a Rota, a Via,

E quem sabe, talvez encontremos o Sentido de Tudo isto com a ajuda da Filosofia.

(António Pinela, Reflexões, 1987).

Nota: publicado no blog em 2013:

12.04.13

Assim vai a liberdade concebida pela direita


António A. B. Pinela

A direita retrógrada, saudosista, passadista não perdoa. Há quarenta anos perdeu privilégios, deixou de ter o monopólio da liberdade, do poder, da economia e adorava ser adulada. O povo ergueu-se contra ela,  acompanhou a revolução de Abril e mostrou-lhe que o poder é de todos, a liberdade é um bem comum, o mais precioso de todos os bens, e que os bens económicos também são de todos. Muitos daqueles que engrossavam aquela direita, uns vestiram o fato de macaco e a pele de democratas, deixaram crescer a barba e o cabelo – querendo simbolizar que até eram revolucionários; outros calaram-se e foram passando desapercebidos; outros ainda, os mais endinheirados, meteram o rabo entre as pernas e fugiram para outros países que lhe deram acolhimento. Mas eles nunca esqueceram os privilégios que tinham em 24 de Abril de 1974. Como poderiam esquecer?

Passada a fase do entusiasmo de Abril, com a normalidade de um Estado de Direito, que Portugal foi sedimentando; passadas algumas convulsões políticas, sociais e militares; regularizada a posição de Portugal na Europa; a direita portuguesa, ainda envergonhada, começa a organizar-se e a regressar. “Fez-se” democrata, fingiu aceitar as regras do jogo democrático, mas nunca foi capaz de esconder quais seriam os seus verdadeiros objectivos, assim que pudessem: voltar ao 24 de Abril.

Há sinais evidentes que apontam nesse sentido, tais como: 1) O desejo de  eliminar o Estado Social: desmantelando o Serviço Nacional de Saúde; emagrecimento da Escola Pública; destruição da Segurança Social. 2) Empobrecimento do povo para mais facilmente o dominar; e, como estucada final, enfraquecimento da classe média, dado que é esta que tinha poder reivindicativo. Com estes desideratos conseguidos, à direita saudosista só faltaria alcançar mais um grande objecto: controlar a comunicação social, que já começou.

Esta reflexão é sugerida pelo tema que tem feito as manchetes dos jornais e as aberturas dos telejornais: o regresso de José Sócrates ao comentário político na RTP. Bem sei que o anterior Primeiro-ministro desperta ódios e paixões; que, na sua governação, cometeu erros; mas também sei que desde que saiu do governo, e se remeteu ao silêncio, tudo tem sido dito a seu respeito, tudo a direita tem feito para se livrar dele. Creio que, nestes últimos quarenta anos, nunca houve tantos ataques pessoais a um ser humano. Podemos e devemos mostrar as nossas discordâncias políticas, seja com quem for, isso faz parte da democracia, mas já não me parece que seja muito democrático e sério, o insulto, a insídia e o impedimento de alguém se manifestar através da palavra.

É o que a direita saudosista, finalmente agora no poder, quer fazer: Impedir que o anterior Primeiro-Ministro se expresse, mesmo se foi convidado a fazê-lo por um canal de televisão. Esses que querem controlar a televisão, já terão contabilizado quantos comentadores de direita passam pelas televisões? Não. Então façam esse exercício. O comentário político de José Sócrates é bem-vindo, gostemos ou não dele, como o de outros democratas de esquerda. O direito ao contraditório faz parte da democracia. Sem esse direito não existe democracia. Estas notícias mostram bem como é que alguns néscios entendem a democracia.

Mas porque razão não quer o PSD/CDS que José Sócrates apareça na RTP? a) É porque pensam que a RTP é deles? b) É porque são eles que querem programar a RTP? c) É porque prometeram "mundos-e-fundos" e enganaram o povo e não querem ser desmascarados? e) Ou é porque temem as “verdades” de José Sócrates? Sim, porque ele também terá as suas verdades a comunicar. Grandes democratas me saíram estes senhores! Todos os desempregados do PSD arranjaram um lugarzinho de comentador de tudo, alguns são mesmo encartados, são aqueles que sabem tudo. O PSD tem cinco antigos  presidentes do partido, entre eles um antigo Primeiro-Ministro, a fazer comentário político: Luís Filipe Menezes, Manuela Ferreira Leite, Marcelo Rebelo de Sousa, Marques Mendes,  Pedro Santana Lopes. Mas também outros, de menor nome.

A terminar esta reflexão, direi que José Sócrates tem sido tratado de forma irracional e grosseira pela direita no poder. Eles cegam só de pensar que Sócrates virá dizer alguma coisa que não lhes convém. Estes cavalheiros deveriam era ocupar-se com a governação do país, para a qual foram designados; eles deviam era pensar no que disseram em campanha eleitoral e comparar com o que estão a fazer e corrigir as políticas desastradas que estão a aniquilar Portugal; já chega de desculpas; já chega de dizer que a culpa é dos outros. E quais são as culpas do PSD/CDS, que ainda não foram capazes de, em dois anos, acertar numa política? Erram sempre. Exemplo típico disso é o famoso ministro das finanças que, ao que parece, é muito elogiado lá fora, enquanto cá dentro é odiado.

Vejamos como Vítor Gaspar iniciou a sua conferência da 7.ª avaliação da troika: «A 7.ª avaliação foi positiva». Positiva? Como positiva, se o povo está cada vez mais na miséria, porque lhes cortam os salários e as pensões e lhes aumentam os impostos? Positiva, se o Estado está cada vez mais endividado? Remodelem-se ou partam… (Março/2013).

António Pinela, Reflexões.

12.04.13

O maniqueísmo neoliberal


António A. B. Pinela

O governo de Passo Coelho/Vítor Gaspar/Miguel Relvas, dia sim, dia não, quando não todos os dias, lança novos ‘soundbites’ (não é assim que dizem os “tudologos”, na expressão feliz de António Chainho?), que rapidamente se transformam em “factos”. Escolhem um ambiente apropriado, onde a contestação não se fará de imediato; por exemplo, numa qualquer reunião do PSD ou da JSD; num jantar (ou semelhante) com empresários; numa visita ao estrangeiro, ou quando algum ilustre governante ou comprador (dos restos de Portugal) de outro país visita o nosso. Ambientes que sabem que não lhe serão hostis, pelo contrário.

O passo seguinte, já se sabe qual é, está no manual deste governo: figuras bem instaladas na sociedade, ‘grandes’ gestores, empresários de grandes empresas, comentadores de serviço, que tudo sabem melhor que ninguém; e, espalhados pelo país, alguns ilustres “sociais-democratas”, que nunca sentiram as agruras da vida, preparam o terreno local e nacional para a tal sementeira destrutiva “social-democrata”. Ou seja, os tais ‘soundbites’ passam a temas da ordem do dia do governo, com vista à estucada final. É assim que funcionam estes senhores que, enganando o povo que lhe deu o voto, acederam ao poder e aniquilam o país.

Qual é, então, a grande descoberta política de Passos Coelho? O maniqueísmo! Os ricos e os pobres; os empregados e os desempregados; os novos e os velhos; as empresas privadas e as empresas públicas; o ensino privado e o ensino público; a saúde privada e a saúde pública. Os primeiros são os bons, os segundos, os maus. É esta a ‘socio-visão’ “coelhista”. Portanto, Coelho tem uma visão dualista da sociedade, dividindo-a entre os bons e os maus, que, na sua génese, se opõem. Os ricos, os empregados, os novos, as empresas privadas, o ensino privado, a saúde privada, os partidos do governo são intrinsecamente bons; os pobres, os desempregados, os velhos, as empresas públicas, o ensino público, a saúde pública, os partidos da oposição são intrinsecamente maus.

Um governante pode, mas não deve dizer o que inopinadamente diz de um povo. Ao ouvir-se Passos Coelho fica-se com a sensação que ele pretende colocar portugueses contra portugueses; de um lado os bons: onde ele, o seu partido e os restantes figurões se incluem; do outro os maus: os desamparados, os reformados, o sector público, a gentalha, etc.

A mais recente oposição de contrários, entre bons e maus, que Passos Coelho criou, está entre jovens e seniores. Vai dizendo ele, e não só ele, que os Velhos reformados e pensionistas estão a usufruir mais do que o que descontaram para a Segurança Social ou Caixa Geral de Aposentações. E é por isso, li algures, que o país se endividou, porque temos regalias sociais muito elevadas! Ora, permito-me dizer, com toda a veemência, que o povo português não tem regalias sociais a mais, o que tem, e devem ser respeitados, SÃO OS SEUS DIREITOS SOCIAS, que o PSD/CDS quer retirar aos portuguese e colocá-los na vivência miserável do 24 de Abril.

Onde o Estado se endividou não foi com os trabalhadores nem com os velhos, mas sim com o desperdício que ocorre em várias instituições; com os volumosos salários e mordomias atribuídos a alguns gestores públicos; com institutos públicos de duvidosa eficácia, que proliferam pelo país; com apoios atribuídos a fundações que não sabemos para que servem; com tantos gastos supérfluos que os governos fazem com grupos de trabalho para efectuar estudos que não se conhecem; com as rendas pagas às famosas PPP’s, que o governo tarda em rever seriamente. Há muito por onde cortar, mas é mais fácil cortar aos fracos para os fazer rastejar. Os fortes, porque são fortes, estão protegidos, são eles que sustentam este governo (Dezembro de 2012)

António Pinela, Reflexões.